sexta-feira, setembro 08, 2006

Poema de Alvaro de Campos

O que há em mim é sobretudo cansaço
O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
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A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
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Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
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E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...
Álvaro de Campos
(remetido para o Blog por Iemanjá)
Comentário da Maria: cá para mim neste desvastador e lindissimo poema quando Alvaro Campos se refere a "eles" está a mencionar as "deusas" :) ! que sob o lema " que seja" não ficam cansadas de amar, se apaixonar, chorar, procurar até ao infinito e rir....

3 comentários:

Anónimo disse...

Aceito... Ainda bem que há Marias que nos lembram de que o «que seja!» é um GRANDE lema. E Deusas !...
Ah!!... Iemanjá é deusa, também, ainda que de outras paragens...
Que vivam as Deusas!!!
Iemanjá

maria disse...

Ainda não consigo comentar este poema lindíssimo...

maria disse...

Deprimido? Sonhador? E não será que estas são as 2 faces duma mesma realidade?
O cansaço é horrível. O desalento pior ainda. Não há dúvida que "... o sonho comanda a vida".